A gente não quer só comida, mas o que a gente quer?
A gente já não quer só saída, mas onde é que a gente está?
A gente não quer só promessa, mas o que é que a gente faz?
“Política não se discute”: o que não se discute é a necessidade de discutir política, de pensar, todos os dias, que tudo começa a partir da ação de um único indivíduo, o eu – você. O que não se discute é a verdade universal de sermos cidadãos de direito e, como tais, termos a honrada missão de estar cientes do que se passa em nossa volta. O que não se discute é que todos, sem exceção, somos responsáveis diretos pelo país que construímos.
É fácil – repito, fácil – culpar aqueles que estão distantes. É fácil apontar os dedos para os nossos governantes e atribuir a eles tudo quanto há de errado no mundo. É fácil falar de uma sociedade problemática sem nos colocarmos dentro dela. É cômodo derramarmos mil lágrimas sob a corrupção e não nos darmos ao trabalho de analisar o candidato que nos sorri na urna de votação. É cômodo repetirmos, aos quatro cantos, que tudo está errado no mundo e não abrirmos nossos olhos para o que está sendo feito para melhorá-lo. É comodíssimo partirmos da idéia de que não adianta tentar. É conveniente criticar os que criticam.
Por definição, política é arte. Mas não é – ou não deveria ser – a arte falha da encenação, com platéia e roteiros definidos. Arte do improviso, menos ‘stand up’.
“Não gosto de política, mas gostaria de ter um trânsito seguro, uma escola pública eficaz, um hospital que me privasse do pagamento de um plano particular”.
“Não gosto de política, mas queria que o meu filho não fosse obrigado a estudar em uma Universidade no outro canto do país porque no meu estado não há vagas”.
“Não gosto de política, mas acharia ótimo se os impostos que me cobram fossem bem aplicados, que a violência diminuísse, que não houvesse esgotos a céu aberto no meu bairro”.
“Definitivamente, não gosto de política. Mas como gostaria de ver o Brasil dando certo e ‘fazendo bonito’ lá fora!”.
Há a política. Há os políticos. Há os que a constroem mal e porcamente. E existe todo o resto.
“Lembre-se: quem tem nojo de política é governado por quem não tem.”*
Poderíamos, então, nos enojar pelo que nos é de direito?
*Frei Betto – Revista Caros Amigos, Janeiro – 2012.